De Quarentenário a nome de religiosa: bem-vindos ao Jardim Irmã Dolores
- nickpedrosajor
- 7 de out. de 2021
- 3 min de leitura
Essa é a última grande área foco de invasão na Área Continental

Antigamente chamado de Quarentenário, o Jardim Irmã Dolores foi criado após a última grande invasão na região, na década de 90. Durante esse tempo, e até os dias atuais, o bairro passa por mudanças que dão nova identidade ao núcleo.
Durante décadas, a área do Quarentenário, que pertencia ao Ministério da Agricultura, foi lugar para recepção e manutenção do gado que vinha do interior paulista de trem. Os bois e as vacas ficavam no local por 40 dias, período necessário para verificar se havia alguma doença nos animais e para engordá-los. Após o prazo, o gado que estava saudável era encaminhado ao Matadouro Santista, na antiga linha 1, atual Avenida Nossa Senhora de Fátima, na Zona Noroeste, em Santos, para ser abatido.
Imagens antigas de como era o local - Arquivo: Prefeitura de São Vicente (PMSV)
Com o final das atividades no Matadouro, aquela área parou de receber o gado. Passaram-se anos e a expansão demográfica aconteceu. O Distrito Samaritá (antigo nome da Área Continental) começa a ser habitado, seja de maneira ordenada, com conjuntos previamente criados ou por invasões, como é o caso do Quarentenário, que surgiu na década de 90.
A explicação do nome é simples: a região servia de quarentena ao gado, logo, o nome escolhido foi Quarentenário. E disso, seu Gilson dos Santos, 62 anos, lembra muito bem. Ele está no bairro há 31 anos.
“Conseguir um terreno aqui? Foi fácil, ganhei de presente de um grande amigo”, diz ele. “Morava no bairro Encruzilhada, em Santos, e pagava aluguel. Quando surgiu a chance de ter uma casa própria, não pensei duas vezes. Cá estou eu há 31 anos”.
Imagens de como está o bairro atualmente - Fotos: Nícolas Pedrosa
A metragem dos terrenos era delimitada pelos próprios moradores. Dona Maria Tereza, 60, morando há 29 anos no bairro, diz que não teve medo de arriscar a morar na região, na época. “Não me arrependo do que fiz. Ganhava pouco e pagar aluguel era muito ruim. Peguei minha trouxa de roupas e vim pra cá. Sou feliz demais aqui”.
Ela acompanhou de perto todo o crescimento do bairro. “Antigamente, o pessoal tinha medo da violência, mas hoje é diferente, melhorou demais. Espero seguir morando aqui para sempre”, completa dona Maria.
Outro morador que viu a evolução de perto foi o aposentado Cícero de Araújo, 65. “Quando eu era criança, vinha pra cá para ficar vendo os bois. Achava aquilo maravilhoso”, diz.
Ele também morava de aluguel na Cidade Náutica, na Área Insular, e, quando soube que estavam invadindo novas áreas na parte continental da Cidade, logo pensou: “Vou correr lá, demarcar meu lugar e recomeçar minha vida. E cá estou eu há 32 anos”.
Clique no (i) para descobrir algumas coisas que a Avenida do Quarentenário possui - Thinglik: Nícolas Pedrosa
Nem a falta de acesso, já que a parte rodoviária da Ponte dos Barreiros foi inaugurada em 1994, atrapalhou os moradores na construção de suas casas. “Os materiais de construção vinham por Cubatão ou Praia Grande e ninguém tinha medo de entrar aqui, mesmo com os caminhos esburacados e cheios de lama. As pessoas vinham construir casas a pé pela linha do trem”, relata Cícero.
À Irmã Dolores, uma justa homenagem
A religiosa Maria Dolores Muñiz Junqueira, popularmente conhecida como Irmã Dolores, dedicou grande parte de sua vida aos mais necessitados. E algumas de suas ações estão no Quarentenário, bairro que recebeu, em 2008, o seu nome.

Segundo relatos dos moradores, ela chegou à Área Continental em 1987 para ajudar na construção de uma igreja no Humaitá. Ela morava no Samaritá e, após o início da ocupação no Quarentenário, foi auxiliar na ordenação. Para chegar ao foco da invasão, Irmã Dolores caminhava pelos trilhos do trem. Com a ajuda dos invasores, a irmã demarcou o território para edificar a igreja (a Nossa Senhora da Esperança) e uma escola.
Ela também comandou, segundo contam, os pedidos de implantação de caixas d’água potável e a instalação da rede elétrica. E chefiou a luta para construção de postos de saúde, escolas, uma casa de partos e a criação do único restaurante popular Bom Prato.

A vontade de estar com os pobres e ajudá-los era o que motivava a religiosa a realizar tantas ações, de acordo com moradores. Irmã Dolores faleceu em 30 de agosto de 2008, devido complicações causadas por uma broncopneumonia.
Por: Nícolas Pedrosa
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